Vida

Mesmo no meio das maiores dificuldades, podemos encontrar esperança

Introdução:

Trazemos aos nossos leitores uma história sobre a vida, a coragem e a esperança, mesmo no meio das maiores dificuldades. Uma história que mostra como a maternidade, mesmo quando inesperada e desconcertante, é uma fonte de profunda alegria. Quem no-lo assegura - na primeira pessoa - é a Deisa!

A nossa entrevistada, Deisa, é natural de Cabo Verde, mas reside em Portugal há alguns anos. Pouco depois de chegar ao nosso país, soube que estava à espera de bebé, e ficou cheia de medo. Apesar de sempre ter desejado a maternidade, aquele estava longe de ser o momento ideal para receber uma criança: estava longe da sua terra de origem e do pai da criança, não tinha casa própria e estava desempregada.

No meio desta grande aflição, o seu impulso inicial foi considerar a opção de abortar. Mas acabou por mudar de ideias, depois de ter recebido ajuda de uns “anjos” que apareceram no seu caminho. Hoje, conta-nos o seu testemunho de esperança e de alegria por ter escolhido a vida da sua filha, e explica-nos que já não consegue conceber a ideia de não ter a junto de si.

ENTREVISTA

Olá, muito obrigada por me receberem. Eu sou cabo-verdiana e tenho dois filhos. O meu primeiro filho nasceu em Cabo Verde, e a minha segunda filha nasceu já aqui em Portugal. Vim para cá para uma consulta médica com o meu filho mais velho, depois de ele ter sofrido um acidente. Ele tinha sido operado em Cabo Verde, mas a cirurgia não correu bem, por isso, viemos à procura de uma nova opinião médica e de melhores tratamentos. Foi então que descobri que estava grávida.

Nessa altura, eu encontrava-me longe do meu país de origem e não estava amparada pelo meu companheiro, que estava em Cabo Verde a trabalhar. Já eu, em Portugal, não só não trabalhava como nem tinha a documentação necessária para poder arranjar trabalho. Não tinha como pôr o meu filho mais velho numa escola e também não tinha casa própria, residia com uma tia.

Era este o panorama das nossas vidas, quando percebi que estava grávida. Por isso, fiquei aflita. Pensei: “Como vou cuidar de dois filhos? Não tenho dinheiro, estou sozinha, sem o meu companheiro, não tenho a minha própria casa, estou a depender da casa da minha tia... Como vou fazer com um novo bebé?”. Foi muito difícil. Não via saída. Só pensava que a única solução seria abortar, não via outra possibilidade. Eu queria dar boas condições à minha filha, e isso não me parecia possível.

Como foi a reação das pessoas à sua volta? Os seus familiares ajudaram?

Alguns familiares ajudaram-me muito. A minha cunhada e o meu primo foram fundamentais. Eu não conhecia nenhum lugar, e eles ajudaram-me com as consultas, com as deslocações, com o meu filho. Ajudaram-me também a procurar uma escola. Estiveram sempre presentes. No entanto, mesmo com o apoio deles, continuava insegura, só pensava: “Como vou sustentar esta criança depois de nascer? Será tudo muito caro”.

Mas se, por um lado, pensava em abortar... Por outro, pensava que gostaria de levar a gravidez até ao fim! Eu sempre tinha querido ser mãe, por isso a ideia de ter mais um bebé, em abstrato, era uma coisa boa. Ao mesmo tempo, olhando para a situação concreta, não esperava a vinda de um bebé naquele momento, nem daquela forma. Por isso, apesar do desejo antigo da maternidade, no meio de tantas dificuldades, vinham-me à cabeça os pensamentos sobre o aborto.

“Como vou sustentar esta criança depois de nascer? Será tudo muito caro”.

Chegou mesmo a procurar informação sobre aborto?

Sim, fui a um centro de saúde e sugeriram-me que abortasse. Deram-me os contactos de uma clínica onde se fazem abortos. Cheguei a ir até lá e foi à porta da clínica, precisamente, que fui abordada por duas pessoas que mudaram a minha vida.

Como foi essa abordagem?

Essas pessoas falaram comigo com muito respeito e empatia. Não houve qualquer tipo de pressão ou julgamento, quiseram ouvir-me e saber as minhas razões. Ao perceber os meus motivos de preocupação, ofereceram-me palavras de conforto e mostraram-se disponíveis para me ajudar de forma concreta com consultas e apoio material.

No fundo, mostraram-me que eu não estava sozinha e que os meus problemas se poderiam resolver. Senti-me apoiada! Foi ali que comecei a acreditar que talvez conseguisse continuar com a gravidez. Agradeço muito aquela conversa.

Muitas pessoas estão com pressa para abortar e não querem ouvir ninguém que lhes diga algo de sentido contrário ao aborto. Mas eu acho que qualquer pessoa deve ter um tempo para ouvir.

E, depois dessa conversa, decidiu seguir em frente com a gravidez?

Sim. Foi uma decisão difícil, mas transformadora. Sempre quis ser mãe e, apesar de todas as dificuldades, decidi dizer “sim” à vida da minha filha. Hoje olho para ela e nem consigo conceber que alguma vez tenha ponderado o contrário.

Que tipo de apoio recebeu depois?

As mesmas pessoas que me abordaram naquela altura, na clínica, ajudaram-me com tudo: com fraldas, biberons, um enxoval e, sobretudo, com apoio emocional. Não eram da minha família, mas estiveram ali como verdadeiros “anjos”. Mostraram-me que pedir ajuda não é sinal de fraqueza: é sinal de coragem e de abertura de espírito. Foi uma sorte ter encontrado pessoas assim, pessoas que nem eram da minha família.

E como está hoje a sua filha?

Maravilhosa! Ela é uma alegria para todos. Na escola, sorri para toda a gente, é impossível não sorrirmos quando estamos com ela. Pensar que ela podia não existir... parte-me o coração. É uma bênção na minha vida. Temos de perceber que cada criança é especial, que cada criança é irrepetível e diferente de todas as outras crianças. É horrível, agora, pensar que por momentos ponderei abortar. Hoje, quando olho para a minha filha, não consigo lembrar-me de como pensei em fazê-lo.

Volto várias vezes à porta da clínica onde fui abordada, para falar com outras mulheres. Vou muitas vezes lá porque, na verdade, foi por uma conversa dessas que eu não abortei e que tenho a minha filha. Por isso, não posso ficar indiferente à ideia de poder ajudar alguém. Se uma conversa que tive com pessoas que lá estavam, durante a minha gravidez, mudou o destino da minha filha, então eu também quero estar ali para apoiar outras mães.

Hoje olho para ela e nem consigo conceber que alguma vez tenha ponderado o contrário.

Pode dar-nos um exemplo de uma situação na qual ajudou alguém?

Claro! Um dia, ao deixar a minha filha na escola, uma mulher perguntou-me onde ficava a clínica. Pelo jeito da pergunta, percebi que estava a considerar o aborto e conversei com ela. Ela tinha dois filhos e o companheiro tinha ameaçado acabar a relação que tinham se ela não abortasse. Pedi-lhe para não abortar e liguei para uma pessoa que sabia que poderia ajudar. No final, ela decidiu continuar com a gravidez. Foi um dos momentos mais felizes da minha vida. Fiquei muito feliz! Saber que ajudei a salvar uma vida é algo que nunca esquecerei.

O que diria a uma mãe ou a um pai que se encontrem numa situação como a sua, em que a opção do aborto esteja em cima da mesa?

Diria que não há motivo para se tirar uma vida. Mesmo quando tudo parece difícil, há sempre alguém disposto a ajudar. Saibam que não estão sozinhos, por isso não tenham medo de pedir apoio, há sempre soluções. Por fim, o mais importante é que uma criança é sempre uma dádiva, mesmo quando chega num momento inesperado.

Por fim, o mais importante é que uma criança é sempre uma dádiva, mesmo quando chega num momento inesperado.

Conclusão:

A Deisa lembra-nos que, mesmo nas circunstâncias mais adversas, o apoio humano, a escuta atenta e a caridade podem ser decisivos. A sua mensagem final é clara e poderosa: a vida é sempre uma dádiva e vale a pena defendê-la, mesmo quando acolhê-la parece impossível. A sua história é marco de esperança para todas as pessoas que, como ela, um dia se considerem perdidas. E é também um abrir de olhos: lembra-nos que, com atenção, empatia e ajuda concreta, cada um de nós pode ajudar pessoas como a Deisa.

25 de março de 2025

Entrevistadora: Mariana Santos

Redação: Afonso Direito e Francisco Pedro

Edição: Maria Alvim